A tradição de alfaiataria das “roupas de domingo”: manual explicativo
No auge da escravidão nos EUA, as missas dominicais e dois conjuntos de roupas eram as únicas liberdades concedidas às comunidades escravizadas. Um desses conjuntos era reservado exclusivamente para a igreja. Enquanto muitos tratavam seu modo de vestir como um sinal de reverência a Deus, para outros era um momento de se apresentarem em seus melhores trajes e mostrarem sua glória em grande estilo. Foi assim que nasceu o termo “Sunday Best”. A roupa de domingo é uma tradição que passou por diversas gerações na comunidade negra do mundo todo e, ainda hoje, influencia os criativos.

Georgia, USA, 1899; Pittsburgh, USA, 1941; Aitutaki, The Cook Islands; Kingston, Jamaica; Douala, Cameroon; Harlem, New York; Harlem, New York; Ikutha, Kenya; Mar Lodj, Senegal; Kensington, London; Brixton, London; Malakula, Vanuatu; Matuku, Fiji; Mahajanga, Madagascar; Mulago, Uganda; Nevis; Saint Croix, Virgin Islands; South Carolina, USA; Vieux Fort, St. Lucia; Soufriere, St. Lucia © Alamy
A igreja foi uma benção para a comunidade negra quando eles não tinham nenhuma expectativa”, diz Karen Binns, diretora criativa e stylist de Nova York. Mas o espírito de usar as melhores roupas no domingo foi um conceito que ultrapassou a comunidade negra dos EUA. Para a Dra. Christine Checinska, curadora da exposição Africa Fashion, do V&A, em Londres, que é descendente de afro-caribenhos e cresceu no Reino Unido, “o Sunday Best fazia parte da nossa semana – as roupas tinham que ser lavadas e passadas, os sapatos tinham que ser engraxados, o cabelo tinha que estar bem arrumado”.
Omoyemi Akerele, fundadora e CEO da Semana de Moda de Lagos e da Style House Files, conta uma experiência semelhante e explica que, na Nigéria, esse ritual dominical ia além da classe ou do poder econômico. “As pessoas viviam com intenção, e uma extensão natural disso é se expressar através do que vestem. Elas dão o melhor de si independentemente da situação econômica.”

Hoje, um conceito que surgiu de uma história traumática – uma forma de proclamar o valor negro e combater o estereótipo de que eles são desleixados – tornou-se uma fonte de inspiração e celebração para muitos criativos. O estilista Christopher John Rogers usou sua coleção de primavera-verão de 2019 para homenagear os extravagantes figurinos de igreja que via na sua infância em Louisiana, nos Estados Unidos. Em sua coleção (Always) Wear Your Best On A Sunday, a fotógrafa sul-africana Alice Mann examina a relação entre moda e religião na diáspora negra. A fotógrafa londrina Katie Waggett também captura os códigos culturais de vestuário e religião no seu livro Sunday Best. E As We See It de Aida Amoako – um livro que explora o olhar negro através da fotografia e da arte – destaca imagens de Lana Turner, socialite e figura proeminente na tradicional Igreja Batista Abissínia do Harlem, feitas pelo fotógrafo Dario Calmese.
No entanto, para a comunidade negra, o Sunday Best não se limita mais à igreja. Em vez disso, diz Omoyemi Akerele, “o Sunday Best se tornou um modo de vida”.
Yelena Grelet é jornalista freelance e mora em Londres