A nova onda de perfumistas descolonizando a indústria de fragrâncias
A fragrância nos convida a sonhar em tecnicolor e viajar com o olfato, mas as figuras por trás da sua criação são predominantemente homens brancos franceses de classe média. Agora, uma nova era de perfumistas e fundadores de marcas está finalmente se infiltrando neste espaço, antes reservado a poucos privilegiados.
A cidade de Grasse, na França, é conhecida como “a capital mundial do perfume”, e os perfumistas que nasceram (ou tinham dinheiro para estudar) lá encheram as perfumarias do mundo com suas criações. Houve tentativas de engarrafar a essência de locais “exóticos”, tradições sagradas e mitologias antigas, mas, quando expressa principalmente a visão de homens brancos, é o tipo de apropriação cultural que, hoje (e com razão), tem sido examinada de perto em outras formas de arte. Só que no mundo da perfumaria, isso é aceito como o status quo. Não significa que muitos perfumistas e marcas não pesquisam extensivamente suas inspirações e seus ingredientes, mas, até muito recentemente, a etnia dos “narizes” envolvidos na composição de fragrâncias nem era considerada. Racismo histórico à parte, a causa é bem simples: a perfumaria é um ponto de encontro entre arte e ciência. Para estudar química, e mesmo saber que a perfumaria pode ser uma carreira, é preciso ter um certo nível de privilégio. Além disso, em Grasse, o bastão de perfumista é passado de pai para filho, sem contar as dificuldades corriqueiras: horários de trabalho inflexíveis, falta de creches e o viés inconsciente de mentores masculinos, que tendem a contratar pessoas parecidas com eles. O resultado é uma tempestade perfumada de preconceito. Até pouco tempo atrás, com exceção de alguns casos isolados que se destacaram no final dos anos 70, mulheres e pessoas negras não eram incentivadas a estudar Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática. No Instituto de Educação da University College London, Louise Archer e sua equipe criaram o ASPIRES – um projeto de pesquisa de longo prazo que investiga o seguinte fenômeno: embora as meninas se saiam bem em ciências nos exames do ensino médio, “elas ainda acham que não são boas ou inteligente o bastante para estudar essas matérias na universidade”, diz Louise. “É uma atitude particularmente comum em meninas da classe operária e de origens não brancas.” As pessoas não brancas são a maioria da população mundial. Não é bizarro excluir essas vozes (e narizes)? “Parecia tão distante da realidade na minha infância”, diz Maya Njie, uma perfumista que hoje celebra a herança da África Ocidental e Suécia na sua marca homônima. Chris Collins, um dos primeiros modelos afro-americanos a trabalhar com Ralph Lauren e hoje perfumista e dono de uma casa de fragrâncias que homenageia a cultura negra, concorda que, para refletir fielmente as pessoas que os usam, os perfumes precisam de diversidade. “Minhas histórias vêm da minha perspectiva única”, diz ele. “Quanto mais diversidade, mais histórias podemos ouvir.” Cinco casas de fragrâncias que você não deve deixar de conferir:- A Nishane é a primeira casa de fragrâncias turca e tem a missão de colocar Istambul no mapa olfativo.
- O perfumista autodidata tailandês Prin Lomros expressa sua herança através de memórias olfativas.
- Catherine Omai inspira-se na “cultura, paisagem e tradição do povo da Nigéria”.
- Neela Vermeire mostra sua herança indiana através de perfumes requintados e de inspiração histórica.
- Pissara Umavijani, que cresceu na Tailândia, celebra a poesia do seu pai com a marca Parfums Dusita.
Suzy Nightingale é uma premiada jornalista freelance de fragrâncias que já escreveu para The Perfume Society, Grazia Middle East e Rakes Progress. Ela coapresenta o podcast On The Scent